Diretor-geral da Aneel aprova venda de distribuidora de energia do AM ao grupo J&F; impacto nas contas de luz é de R$ 14 bilhões

Transação teve sequência de reviravoltas nas últimas semanas. Âmbar, ligada ao grupo dos irmãos Batista, tenta aproveitar regras de medida provisória prestes a caducar para repassar parte maior dos custos aos consumidores. O diretor-geral da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Sandoval Feitosa, aprovou a venda da distribuidora do Amazonas, a Amazonas Energia, ao grupo J&F, dos irmãos Wesley e Joesley Batista.
O negócio implica custos de R$ 14 bilhões aos consumidores, que serão repassados às contas de luz.
A decisão foi tomada por Feitosa de forma monocrática, ou seja, sem deliberação pela diretoria colegiada da Aneel –o que é incomum na agência.
O g1 teve acesso ao documento, que foi assinado no domingo (6), mas ainda não foi publicado no “Diário Oficial da União”. Procurado, o diretor-geral da Aneel preferiu não se manifestar.
O aval para a venda da Amazonas Energia aos irmãos Batista foi assinado dois dias antes da reunião extraordinária que iria analisar o recurso apresentado pelas empresas contra decisão da agência que aprovou a transferência, mas com condições definidas pela área técnica.
A Âmbar Energia –empresa do grupo J&F, que vai adquirir a distribuidora— recorreu da decisão por alegar que os termos da aprovação tornam o negócio inviável.
O despacho de Feitosa foi assinado depois de uma decisão judicial que deu 24 horas para a Aneel aprovar a venda da Amazonas Energia conforme a proposta submetida pela Âmbar.
Nesta segunda-feira (7), depois de o diretor-geral ter dado aval ao negócio, a Justiça Federal publicou nova decisão judicial em que determina que Feitosa comprove o cumprimento da determinação, nos termos:
aprovação do plano de transferência de controle acionário apresentado pela Âmbar Energia em 26 de setembro.
A decisão também determina que o diretor-geral da Aneel “deve ser intimado com urgência a dar imediato cumprimento à decisão nos termos acima, de forma monocrática, assinando os instrumentos pertinentes”.
A juíza Jaiza Maria Pinto Fraxe também determina que Feitosa providencie a conversão de contratos de compra e venda de usinas termelétricas compradas pela Âmbar Energia em contratos de “reserva”.
A conversão dos contratos está prevista em uma medida provisória do governo, que perde validade na quinta-feira (10).
Plano aprovado
No último dia 1º, a Aneel aprovou o plano de transferência para a Âmbar. Contudo, os termos aprovados foram determinados pela área técnica, com custos menores aos consumidores, de R$ 8 bilhões.
A Âmbar se recusou a assinar o contrato conforme os termos aprovados pela Aneel e, na quarta-feira (2), entrou com um recurso contra a decisão.
A decisão do diretor-geral da Aneel, no domingo (6), aprova a transferência de controle conforme o último plano submetido pela empresa, com custo de R$ 14 bilhões aos consumidores.
Medida Provisória
A Âmbar Energia corre contra o tempo para aprovar a transferência de controle.
🕐 Isso porque o governo Lula publicou uma medida provisória que prevê a venda da Amazonas Energia com flexibilizações de custos, transferidas ao consumidor, o que torna o negócio mais atrativo para a empresa.
🕐 Contudo, por falta de deliberação pelo Congresso, essa MP perde validade no próximo dia 10.
Por causa da MP, os seguintes custos da distribuidora podem ser transferidos para a Conta de Consumo de Combustíveis (CCC) – paga por todos os consumidores:
▶️furtos de energia, que são altos no Amazonas;
▶️ônus com sobrecontratação involuntária –quando a distribuidora tem mais geração de energia contratada que o consumo de seus clientes;
▶️e outras despesas regulatórias, como custos operacionais e receitas irrecuperáveis (contas de consumidores inadimplentes).
A medida provisória também permite a transferência de contratos de seis usinas termelétricas do regime de “compra e venda de energia” para “reserva de energia”. As usinas foram compradas pela Âmbar Energia dias antes da publicação da MP.
A conversão significa que as termelétricas contratadas diretamente pela Amazonas Energia por meio de receitas próprias e da Conta de Consumo de Combustíveis –um encargo na conta de luz para bancar usinas na região Norte– passarão a ser custeadas exclusivamente pelos consumidores.

Isso reduz a sobrecontratação da Amazonas Energia e reduz o risco de inadimplência para as usinas. Tanto as termelétricas quanto a distribuidora foram compradas pela Âmbar.
Entenda o impasse
A Amazonas Energia é a distribuidora responsável pelos serviços de energia no estado do Amazonas.
A empresa enfrenta uma crise financeira que levou à recomendação de cassação do contrato junto ao Ministério de Minas e Energia.
A Eletrobras detinha a concessão no estado. Após a Eletrobras sair do segmento de distribuição, o contrato foi assumido pelo Consórcio Oliveira Energia em 2019.
“Mesmo após o processo de desestatização e garantido o atendimento aos dispositivos legais, regulamentares e contratuais aplicáveis, a distribuidora [Amazonas Energia] não conseguiu atingir níveis sustentáveis do ponto de vista econômico-financeiro”, afirmou a Aneel em relatório de 2023.
A extinção do contrato foi recomendada pela Aneel em novembro de 2023, após verificar que a empresa não tinha condições financeiras de manter a concessão. Ela tem uma dívida de R$ 10 bilhões.
Uma medida provisória publicada em junho pelo governo previa uma mudança de controle da distribuidora. Pelo texto, os adquirentes teriam que apresentar um plano de transferência de controle societário, que deveria ser analisado e aprovado pela Aneel.
A MP previa também tirar da Amazonas Energia um custo que ela tinha que arcar, por contrato, com o acionamento de usinas termelétricas no estado.
A flexibilização das regras para a Amazonas Energia, por meio da medida provisória, foi uma forma de garantir a continuidade da prestação de serviços à população, ameaçada pela situação econômica da concessão.
Em 28 de junho, a Âmbar Energia apresentou o plano para assumir o controle da distribuidora. O documento enviado à Aneel previa a compra da distribuidora pelos fundos Futura Venture e Fundo Milão, da J&F.
Esse plano foi considerado insatisfatório pela área técnica da Aneel, por não solucionar o endividamento da empresa.
Uma decisão judicial, da juíza Jaiza Maria Pinto Fraxe, deu à agência um prazo de 48 horas para que a Aneel aprovasse o plano apresentado em 28 de junho.
Momentos de discussão
A Aneel votou o tema em duas reuniões:
▶️na sexta-feira (27), a diretoria colegiada empatou na decisão, com dois votos a dois. Isso impossibilitou a aprovação da venda, como determinava a decisão da juíza Fraxe;
▶️na terça-feira (1º), o diretor-geral da Aneel, Sandoval Feitosa, mudou seu voto e possibilitou a aprovação a venda da Amazonas Energia, conforme as determinações da área técnica da agência.
Enquanto isso, a Amazonas Energia ingressou com um pedido na Justiça Federal para que a Aneel cumpra a decisão judicial aprovando o último plano submetido pela Âmbar, no dia 26 de setembro.
Esse pedido que foi acolhido pela juíza Jaiza Maria Pinto Fraxe na quinta-feira (3), dando prazo de 24 horas para a Aneel aprovar a medida.
A agência chegou a entrar com recurso na Justiça, mas não obteve sucesso. A Aneel então convocou uma reunião extraordinária para votar o tema na próxima terça-feira (8), mas, no domingo (6), o diretor-geral assinou o despacho que aprova o negócio.

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